Durante o seminário Diálogos sobre qualidade na Educação Infantil: a experiência Paralapracá, realizado em Salvador em novembro do ano passado (2017), especialistas discutiram, em uma roda de conversa dedicada ao tema, os desafios para a garantia do direito à participação da criança. Direito reconhecido pela Convenção dos Direitos da Criança, aprovada na Organização das Nações Unidas (ONU), em 1989. No Brasil, esse direito foi contemplado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) no ano seguinte.
Stela Barbieri, educadora, artista e contadora de histórias, salientou, por exemplo, que a garantia do direito à participação da criança está ligada ao entendimento dos adultos acerca das concepções de infância, que reconhecem meninas e meninos como sujeitos de direitos, repletos de potencialidades. “Uma criança é uma possibilidade em aberto. Na infância, a gente está no estado de ateliê, que é um estado laboratorial, e a gente está sempre dialogando com diversas áreas do conhecimento. Uma criança faz alquimia, trabalha com química, física, sem que se tenha que classificar isso. Se a gente se conecta com cada momento dessa potência das crianças, de investigar cada coisa que elas encontram, essa investigação nos povoa, nos dá estofo”, disse.
Para Ana Oliva Marcilio, consultora associada da Avante – Educação e Mobilização Social e coordenadora de ações estratégicas da instituição, integrante da roda, a participação infantil precisa ser encarada como um importante componente das tomadas de decisões no contexto da Educação Infantil, tal qual já são considerados os componentes proteção e provisão. Segundo a especialista, é necessário reconhecer a potência criadora e transformadora da criança, sua capacidade de avaliar e tomar decisões, agir, resolver problemas, conflitos, criar soluções de maneira transformadora. “Quem melhor do que a própria criança para dizer quando seu direito está sendo violado? Participar é mais do que escutar: é garantir o potencial transformador que toda criança tem. Para tanto, é importante reconhecer que aquilo que ela pensa e faz pode e deve influenciar na tomada de decisão”, afirmou Ana Marcílio.
Educação Infantil de qualidade
Na Creche Municipal Osmira Eduardo de Castro, em Maracanaú (CE) – um dos municípios parceiros do programa Paralapracá -, os espaços, ambientes e tempos foram organizados com a participação ativa das crianças, com o objetivo de potencializar a brincadeira. “Esta ação tem uma intenção pedagógica a partir da escuta das crianças. Hoje elas brincam mais. A gente passou a aproveitar melhor os espaços criando outros ambientes”, disse Lúcia de Fátima Feitosa, gestora-geral da instituição, durante relato de prática compartilhado no seminário do Programa.
Em Camaçari (BA), a coordenadora pedagógica Edna Matos, da Escola Comunitária Brincando e Criando, contou que as formações do Paralapracá possibilitaram uma melhoria da qualidade da Educação Infantil na instituição, a partir da escuta atenta das crianças. De acordo com Edna, a mudança tem sido processual. “Com a chegada do Paralapracá, em 2013, muitas mudanças ocorreram. Toda a equipe passou a fazer a formação. No ano seguinte, tivemos adultos pensando a escola para as crianças. Isso era inquietante. Em 2015, reestruturamos a rotina, colocando a criança no centro do processo educativo. Em 2016, pensamos a escola com as crianças e as famílias. Este ano, seguimos validando a escuta das crianças”, destacou Edna, visivelmente mobilizada pela experiência de coordenar um trabalho feito com as crianças.
Relatos como os de Edna e Fátima são alguns dos muitos exemplos que ocorrem no cotidiano das instituições de redes municipais parceiras do Paralapracá, que, conforme resultados evidenciados pelas práticas e avaliações externas, e reconhecidos pelos municípios, contribui para que a criança pequena tenha uma Educação de qualidade que respeite seus direitos fundamentais, sendo um deles o direito à participação.
O Programa
O Paralapracá visa contribuir para a melhoria da qualidade do atendimento às crianças na Educação Infantil, com vistas ao desenvolvimento integral por meio da formação de profissionais da Educação Infantil. O Programa é realizado pela Avante – Educação e Mobilização Social, em parceria com as secretarias municipais de Educação. Para isso, oferece formação continuada para formadores das redes municipais de Educação, valorizando os saberes de cada localidade e ampliando as referências teórico-práticas a partir das orientações nacionais para o segmento.
O Paralapracá foi lançado em 2010 como um projeto do programa de Educação Infantil do Instituto C&A, originalmente focado na região Nordeste. Desde então, chegou a dez municípios, em dois ciclos de implementação. Em 2015, com a chancela do Guia de Tecnologias Educacionais do MEC, ganhou caráter nacional.
A metodologia do programa Paralapracá foi transferida do Instituto C&A para a Avante – Educação e Mobilização Social em um ato simbólico durante o seminário Diálogos sobre a qualidade na Educação Infantil: a experiência Paralapracá, que ocorreu no dia 30 novembro de 2017 em Salvador (BA).