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"Minha cor é marrom", disse Vinícius

Professora e gestora da Escola Municipal São Bento, no município de Olinda (PE), Heraldina Simões aproveitou a força do mês de novembro, celebrado como o mês da consciência negra, para desenvolver uma atividade utilizando cores, que culminou com pintura corporal, para provocar reflexão sobre a cultura do preconceito e a inmportância de se reconhecer suas origens. Durante a atividade, Heraldina foi surpreendida pela fala de Vinícius, uma das crianças: “Não sou negro. Sou marrom. Negro é horrível”. A Rede Municipal de Olinda é parceira do Paralapracá , no ciclo II (2013 – 2017) do Programa.

REGISTRO

POR: Heraldina Simões, professora e gestora da Escola Municipal São Bento.

Ontem foi dia da formadora/professora encantada trabalhar o tema do mês de novembro, ou de todos os meses. Iniciamos brincando de cor e terminamos brincando com cores em nosso corpo. Vários questionamentos foram levantados, as crianças estão antenadas e espertas. A cultura do preconceito vem de dentro e é preciso erradicar isso de dentro das crianças.  Bem, não dá para contar tudo, claro! Mas, a fala de Vinicius, que é negro, foi contundente. “Não sou negro, sou marrom. Negro é horrível.” Impactos! Vamos trabalhar isso com serenidade. A proposta era deitar e rolar com as cores preto e branco, tão somente. E o resultado foi positivo. 

Já tive oportunidade de trabalhar o tema na Educação Infantil. Todo ano fazemos esse percurso. É claro que, este ano, creio, estou mais empoderada para tratar o assunto. Não só devido às formações que ocorreram nestes últimos anos, como também por essa vivência de mão dupla com as crianças. Venho conversando sobre igualdade racial, fazendo leitura, desenhando, fazendo levantamento de hipóteses, vídeos, debates e, por fim, precisava fazer o fechamento da semana.

Houve toda uma rotina para se chegar à pintura. Passei uma semana pensando como fazer uma atividade que causasse mais impactos, que fizesse eles se olharem, se questionarem, se perguntarem. Então, ontem foi o dia.  Essa escuta, olhar, gestos, risos, recusa, foi tudo visto e questionado. As palavras preconceito, cor, marrom, moreno, branco, clarinho, tudo bem. Mas a palavra “negro” foi muito rejeitada. E por quê?  “Preto é horrível, feio, ninguém gosta”. Foi muito polêmico, porque as crianças já são convictas de que o branco é o melhor. De modo que, decidimos trabalhar a nossa origem que é africana, indígena, portuguesa, pintando partes de nosso corpo.  

Provoquei: somos negros e vamos usar o preto. Neste caso, foram poucos que permitiram o uso da tinta preta. O Vinicius disse que só queria se fosse o branco. Porque ele é marrom (essas atividades dariam para escrever um livro). Ele foi pintado pela colega Kamilly, porque teve a troca, um pintava o outro. Ah! Teve também a desejada atividade da “Mão direita e esquerda”, feita por eles, na qual pintavam uma mão de preto, e outra de branco.

Na Educação Infantil as crianças já desenvolveram seus conceitos de identidade racial. Pesquisas (particularmente norte-americanas) vêm mostrando, de modo recorrente, que, em torno de quatro, cinco anos, as crianças já desenvolveram algum tipo de conceituação ou identificação racial (FAZZI, 2004). Por isso, é tão importante a abordagem do tema, para ampliar as formas de combater preconceitos e violências. Costuma-se achar que as crianças não têm uma forma altamente organizada de pensar. O que não é real. Contudo, precisa das verdades, sem atalhos.  

Espero ter contribuído um pouco nessa ação. No ano passado também trabalhei com crianças de quatro anos sobre igualdade racial e uma das crianças fez uma pergunta bem diferente, sobre homossexualidade. Eu respondi sem atalhos, todos gostaram de saber. Depois uma mãe veio me perguntar o que eu tinha dito.

 

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