Para Márcio Neves, secretário municipal de Educação de Camaçari, investir na educação infantil – não em qualquer educação infantil, mas naquela em que “a criança se sinta dignificada, tenha os seus direitos garantidos, tenha o estímulo que lhe fomente a alegria” – é investir nas próximas gerações de crianças e jovens capazes de contribuir para um mundo melhor.
Em Camaçari, essa porção populacional não é pequena. Conforme dados do Censo Demográfico 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas na faixa com até 5 anos de idade o município abriga quase 24 mil crianças. Das quase 16.500 crianças de até 3 anos, 21% frequentam creches. Já entre as 7.315 crianças de 4 a 5 anos, a inserção nas escolas das redes pública e privada chega a 88,85%.
Neves acredita que a cidadania plena só pode ser atingida mediante a formação de um pacto social em prol da educação. Professor concursado da rede pública do Estado da Bahia, o secretário é licenciado em geografia, mestre em desenvolvimento regional e urbano e está há menos de um ano à frente da pasta de Camaçari. Ele participou do V Encontro Itinerante do projeto Paralapracá, realizado entre os dias 19 e 23 de outubro em Camaçari, e conversou com a reportagem do site do projeto Paralapracá em um dos intervalos do evento.
Paralapracá — Quais têm sido as maiores conquistas da educação infantil em Camaçari nos últimos anos?
Márcio Neves — Conseguir fazer com que o educador se sinta estimulado, respeitado e ao mesmo tempo apoiado. A relação da gestão com o professor se tornou mais integrada. Estamos em um processo de diálogo cada vez mais permanente, de fazer a escuta de todos, para que a educação infantil não só ganhe notoriedade diante da sociedade, mas que ganhe também a confiança dos profissionais que estão hoje atuando nesse segmento.
Paralapracá — E em que estágio está esse processo?
Márcio Neves — Essa confiança vem se consolidando a cada dia. Entre todos os segmentos da educação no município, a educação infantil é o que hoje tem um formato mais bem delineado. É um segmento que tem personalidade. E o profissional novo que chega na rede consegue perceber esse alinhamento e essa identidade. Isso é muito importante, especialmente por conta de o município receber muita gente de fora, inclusive os profissionais.
Paralapracá — O projeto Paralapracá contribui com essa identidade?
Márcio Neves — O Paralapracá está contagiando positivamente toda a rede. O movimento é impressionante: mesmo as unidades escolares que não estão credenciadas no projeto seguem suas orientações, quando os profissionais veem as publicações nas redes sociais e percebem a socialização que se estabelece nas formações da educação infantil. Há uma necessidade de copiar o que é bom e de fazer essa troca de conhecimento.
O Paralapracá tem contribuído muito com a perspectiva de estimular o profissional, para que ele se sinta valorizado, com sua opinião respeitada e se sinta mais preparado para respeitar também o pensar da criança. Muitos profissionais tiveram uma formação no seu passado e agora estão aprendendo a se readequar a esse novo momento. Se fizermos uma análise macro, vemos um processo democrático ainda frágil no país, mas que vem se consolidando. Quando o profissional da educação aprende a ser democrático até na organização da sala de aula, quando ele respeita a opinião da criança, estamos começando a criar o cidadão que vai ter seus direitos garantidos, num processo que está diretamente promovendo e desenvolvendo a habilidade da criança de ser cidadã.
Paralapracá — Como vê a interface da família com o projeto Paralapracá?
Márcio Neves — Vejo duas situações diferentes: os pais que têm um filho mais velho estudando na rede vão exigir que essa escola tenha o mesmo processo de diálogo que eles encontram nas escolas de educação infantil. Se eles não têm um filho mais velho, mas estão experimentando esse modelo de gestão e de relação com a comunidade, vão exigir que na sequência do crescimento do filho isso permaneça. Essa família vai começar a exigir esse processo nas outras unidades. É um desafio enquanto gestor conseguir construir um mecanismo metodológico para que essa forma de dialogar com a comunidade atinja os outros segmentos da educação. Sabemos que, da forma como o processo está sendo construído na educação infantil, vamos ter logo, logo, as cobranças dessa família.
Paralapracá — Além desse desafio, posto para toda a rede, quais os desafios que a educação infantil, especificamente, enfrenta hoje em Camaçari?
Márcio Neves — Em termos de infraestrutura, o desafio é a gente conseguir fazer uma escola que realmente inclua. Que tenha, por exemplo, ao menos uma janela na altura da criança, para que ela possa ver o lado de fora da sala. As salas de aula não são construídas para crianças de educação infantil. Além do desafio desse diálogo em termos arquitetônicos, há o desafio pedagógico, que é conseguir fazer com que projeto Paralapracá atinja as demais escolas da rede.
Quero ressaltar, no entanto, que as formações do Paralapracá estão conseguindo promover uma quantidade significativa de novas formadoras para o município. Esta talvez seja a maior riqueza do projeto: a transferência dessa tecnologia, desse conhecimento. Hoje a gente pode caminhar com os pés que temos, com outros profissionais capazes de dar sequência a este trabalho e também com o nosso comprometimento de conseguir fazer aquisição de materiais que dialoguem com o conceito do projeto Paralapracá.
Fonte: site do projeto Paralapracá