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A casa da viúva Machado

A casa da viúva Amélia Machado é temida no bairro do Guarapes, onde fica o Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Marilanda Bezerra. Hoje em ruínas, a casa é conhecida por todos da região. Conta-se que o lugar é mal-assombrado e que sua antiga proprietária comia fígado de criancinhas.

Argutas e prontas para todo tipo de saber, as crianças do nível 3 da CMEI Marilanda Bezerra conhecem cada detalhe dessa lenda. Ao ouvi-la da boca de seus alunos, a professora Isabel Cristina de Lima Silva percebeu a possibilidade de desenvolver um projeto com sua turma. “É comum trabalharmos com projetos que surgem do interesse das crianças”, explica Isabel.

Dentro do novo desafio, o primeiro passo da professora foi ouvir outras pessoas do bairro. Sim, a casa inspirava mesmo receio da vizinhança, que confirmou que sua antiga moradora era Amélia Machado.

Com esta informação em mãos, Isabel fez uma pesquisa e descobriu que Amélia morava na casa com o marido, Manoel Machado, no início do século 20. Naquele tempo, o bairro do Guarapes — localizado na zona oeste de Natal e bastante distante do centro da cidade — era um importante e próspero centro comercial. Foi ali, de acordo com a pesquisa, num cenário rodeado por dunas e pelas águas do rio Potengi, que funcionou, no século 19, um dos primeiros portos do Rio Grande do Norte.

Manoel Machado era muito rico, dono de terras na região. Quando ele morreu, Amélia ainda era jovem e ficou à frente dos negócios do marido. A viúva mudou-se para o centro de Natal e abandonou a casa, que ficou em ruínas. Independente e avessa a badalações, Amélia foi vítima de boatos na época em que viveu e se tornou personagem da crendice popular depois que morreu.

“Quando descobri a história toda, conversei com a coordenadora pedagógica para discutir se devia endossar a fantasia das crianças, ou contar a verdade para elas”, relembra Isabel. A decisão foi contar a história verdadeira de maneira romanceada e levar a turma para uma excursão à casa da viúva.

“Visitamos o casarão, e os familiares das crianças também foram. No fim, não dei a minha conclusão para a turma, mas eles viram que não tinha fantasma nenhum”, afirma Isabel.

“Quando a gente entrou, estava tudo quebrado, mas eu não tive medo. A casa não é escura e não tinha bruxa”, conta João Vitor Batista, um dos alunos que integraram a expedição. “A janela era quebrada e a porta também. E eu sei que um homem morava com uma mulher na casa”, completa o menino. O projeto culminou no desenho de uma obra, na qual as crianças representam o casarão com Amélia e Manoel na porta.

“A casa da viúva Machado” foi uma das ações desenvolvidas no CMEI Marilanda Bezerra no âmbito do eixo Exploração de Mundo do projeto Paralapracá. De acordo com o caderno de orientação deste eixo, os saberes universais devem andar lado a lado com a cultura local nas instituições de educação infantil.

“A construção da identidade da criança está muito associada aos elementos culturais que ela aprende a valorizar e utilizar como referência. Assim, é essencial que não apenas os saberes universais sejam valorizados, mas que ela também possa reconhecer os elementos da cultura comunitária para interagir com eles, questioná-los, internalizá-los, constituindo-se como sujeito social”, ensina o caderno.

Na sala da professora Isabel, a sugestão da metodologia Paralapracá foi acatada e resultou em um projeto que envolveu crianças, famílias e professora em uma investigação de reconhecimento do bairro, da história da cidade, das crendices populares e de um pouco de cada um.

Fonte: Paralapracá.

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