Uma cidade boa para as crianças é boa para todos. Então, quando uma criança não pode exercer o seu direito de brincar, de ocupar os espaços públicos, é um indicativo de que estamos indo mal, principalmente, no quesito segurança pública e oferta de espaços seguros de lazer. E isso vem ocorrendo com frequência em diversos bairros de Salvador e tem gerado uma série de manifestações públicas que reivindicam mais segurança e pedem paz.
“Toda criança merece, como está no Estatuto da Criança e do Adolescente, que é uma lei que nós temos e devemos seguir, brincar, mas aqui elas não estão tendo esse direito de ficar pela rua porque nada é certo e não tem hora para que esteja uma bala cantando pela comunidade. As mães estão extremamente assustadas de deixar as crianças na rua”, nos conta a agente comunitária de saúde, Fátima Gavião, moradora antiga do Calabar, comunidade de Salvador-BA.
A voz de Fátima se soma a de tantas outras mulheres e mães que temem por seus filhos. E o medo é justificável. A Bahia ocupa o primeiro lugar do país em número de mortes decorrentes de intervenção policial, com 1.464 óbitos, que correspondem a 23% de todo o país, segundo dados coletados em 2022. Além disso, o estado concentra seis cidades entre as dez mais violentas, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública este mês (julho/23).
O município mais violento do Brasil é Jequié, localizado no interior do estado da Bahia, e que tem uma taxa de mortes violentas de 88,8 por 100 mil habitantes, mais que o dobro da média nacional. Em seguida está Santo Antônio de Jesus, com 88,3 mortes violentas por 100 mil habitantes. Salvador está em 12º lugar no ranking nacional, com taxa de 66 mortes violentas intencionais a cada 100 mil habitantes. Os dados do Anuário se baseiam em informações fornecidas pelas secretarias de segurança pública estaduais, pelas polícias civil, militar e federal.
Com a experiência de quem nasceu na comunidade no Calabar, Fátima se soma a um grupo de moradores que pretende chamar a atenção do poder público para as necessidades de políticas públicas, projetos e programas que assegurem qualidade de vida aos moradores da comunidade e políticas de segurança que garantam o direito à vida, especialmente dos jovens.
No dia 26 de julho (quarta-feira), representantes da comunidade realizaram a Caminhada da Paz Calabar – 2023, cuja concentração foi na Praça Zumbi dos Palmares (Praça do JUC). O Coletivo Mulheres de Fibra Calabar, o Levante Popular da Juventude, a Força Feminista Calabar e o grupo Mobiliza Calabar organizaram a ação, que teve como objetivo principal objetivo denunciar a ausência de políticas de segurança no bairro e os inúmeros registros de violência contra comunidade. A manifestação foi pequena, mas inaugurou uma série de outras previstas para acontecer em agosto.
Igor Fagner Silva Gomes, um dos integrantes do Movimenta Calabar, lembra que o grupo teve que cancelar oficinas de brinquedos reciclados e as sessões do cine-clube a céu aberto porque as pessoas passaram a se sentir inseguras nesses espaços. “Precisamos de políticas e projetos para os nossos jovens. Hoje, o bairro não tem oferta para eles, nem para as crianças”, reivindica Igor.
Marcha Incomode no Subúrbio Ferroviário
Moradores do Subúrbio Ferroviário de Salvador-BA, incluindo famílias da Ocupação Quilombo do Paraíso, realizaram a Marcha Incomode – contra o hiper encarceramento e extermínio da juventude negra, em junho, e pretendem realizar outra ação em breve. O ato foi organizado pelo Coletivo Incomode, fundado em 2017, por mulheres negras preocupadas e atentas aos problemas de segurança pública e ações violentas contra os jovens negros/as do Subúrbio.
“O Coletivo Incomode, para mim, foi de extrema importância, a partir do momento que eu entendi que precisava saber lutar pelo direito à vida dos jovens e adolescentes, e principalmente a de meus filhos”, afirma Liliane Alves Santos, mãe de Luiz, jovem que participou de um dos projetos da #OscAvante no território, o Estação Subúrbio – nos Trilhos dos Direitos, voltado para o enfrentamento da violência comunitária, principalmente, contra crianças e adolescentes.
A relação da Avante com comunidades populares de Salvador vem de longa data e o mesmo se deu com o Calabar, escolhida pela instituição para implantar o Balcão da Juventude, em 2012. O projeto teve como objetivo atender jovens com o propósito de apoiá-los no exercício pleno da cidadania e na sua inserção digna no mundo do trabalho. Na ocasião, foram desenvolvidas quatro ações principais: o Balcão de Acolhimento, com espaço de escuta, triagem e encaminhamento das demandas dos participantes do projeto; os Grupos de Desenvolvimento, com espaço para discussão e reflexão de temáticas ligadas à juventude; os Grupos de Projeto de Vida, focados na orientação vocacional e na construção do projeto de vida dos jovens; e a Inserção, com apoio ao jovem na qualificação e inserção no mundo do trabalho.
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